domingo, 31 de março de 2013

A história da mercadora do tempo



Ruth Belville recebe um certificado do Observatório Real de Greenwich autorizando-a a comercializar a hora certa em Londres em troca de uma taxa.

“Tempo é dinheiro”, é uma frase bastante conhecida. E é verdade. No passado, isso até foi literalmente verdade. Numa época como a nossa, em que bilhões de precisas maquininhas movidas a quartzo mundo afora e mostradores digitais onipresentes em quase todos os eletrodomésticos se esforçam para informar a hora, esta é uma tarefa muito simples. Mas isso é assim há pouquíssimo tempo.

Esta mulher da foto acima é Ruth Belville. Ela é a expressão máxima de que tempo é dinheiro, e isso de modo literal. Durante quase meio século, a partir de 1892, ela vendia a hora certa pelas ruas de Londres. No auge da carreira, a mercadora do tempo tinha mais de 200 clientes fixos, que lhe pagavam um dinheiro diário pelo serviço de receber a sua visita. Em troca do dinheiro, ela mostrava um relógio de bolso, rigorosamente acertado na primeira hora da manhã no Observatório Real de Greenwich.

Ruth havia herdado o seu negócio do pai, John Henry Belville. John era assistente do astrônomo real John Pond, responsável por manter o relógio do observatório pontual. Como naquele tempo era extremamente difícil saber a hora certa, todos os dias uma fila de gente batia à porta do Observatório Real para saber a hora certa. Era tanta gente interrompendo o trabalho do astrônomo, que no ano de 1836 ele perdeu as estribeiras.

Profundamente incomodado com as constantes interrupções, ele encarregou seu assistente de organizar um serviço de informação da hora certa. O assistente Belville recebeu um caríssimo relógio de bolso de precisão, fabricado pelo relojoeiro londrino John Arnold & Son, com o qual ele ia diariamente ao centro da cidade para informar a hora certa em troca de uma módica taxa. Foi o jeito que o astrônomo encontrou para voltar a ter paz no local de trabalho.

O negócio do mercador do tempo cresceu em importância rapidamente, numa Londres em que saber a hora certa era uma tarefa extremamente difícil.  Até o limiar do século 18 chegava a ser uma peripécia saber a hora certa na Inglaterra. Cada vila tinha a sua própria hora e a diferença de uma vila para a outra chegava a mais de 20 minutos ou até a meia hora. Mas como na época tudo se movimentava com cavalos e carroças, poucos percebiam tais diferenças.

Essas diferenças começaram a se fazer notar e a tornar-se um problema com o advento dos trens. Organizar a crescente malha ferroviária inglesa com tantos horários diferentes entre as estações era quase impossível e os acidentes eram bastante comuns, além dos sistemáticos atrasos de trens.

Somente em 1840 a companhia de trens Great Western Railway determinou que em suas paradas houvesse um único horário válido, criando o Railway Time, que se tornou o primeiro padrão de horário em vigor na Inglaterra. Todos os relógios deviam ser acertados pelo horário mais preciso em vigor no reino, o do Observatório Real de Greenwich.

O padrão de Greenwich conquistou cada vez mais adeptos e, em pouco tempo, as outras companhias de trens adotaram sistema semelhante. Greenwich crescia tanto em respeito e confiabilidade, que era ponto de honra para os relojoeiros acertar seus relógios pelo do observatório. Os melhores relógios mantinham a hora certa de Greenwich por dias e, para os cidadãos mais abastados, ter o horário certo de Greenwich em seu relógio de bolso era questão de status.

Com a morte do assistente John Belville em 1856, a sua mulher assumiu o negócio de mercadora do tempo até 1892, passando-o para a filha Ruth, período em que o serviço de hora certa alcançou seu auge. No início do século 20, a hora por sinal de telégrafo e, mais tarde, um serviço por telefone, foram aumentando a concorrência à “Greenwich Time Lady”, que encerrou sua atividade em Londres pouco antes do início da segunda guerra mundial.

Em 24 de julho de 1936 foi criado um novo serviço de hora certa por telefone, pelo qual uma gentil senhorita informava a hora depois que a pessoa discasse os números 846, respectivamente as letras T, I e M. No primeiro ano, “Tim” (como o serviço logo ficou conhecido) recebeu 20 milhões de ligações somente em Londres. Em 1939 Ruth encerrou seu serviço como “Greenwich Time Lady”, quando tinha somente 50 clientes fixos.

(Fonte das informações: www.einestages.spiegel.de)

quarta-feira, 27 de março de 2013

O lado escuro da existência humana



Esta imagem você certamente já viu. Ela é uma das mais famosas capas de disco da história da música moderna, e completou 40 anos. Dentro dela, um disco de vinil de 43 minutos, produzido na Abbey Road Studios a partir de julho de 1972 e lançado no mercado fonográfico acompanhado de um caro e espetacular aporte publicitário, em março de 1973. “The Dark Side of the Moon” tornou-se o terceiro álbum mais vendido de todos os tempos, depois de “Thriller” de Michael Jackson e “Back in Black” de AC/DC. Com 50 milhões de cópias comercializadas até hoje, o álbum integralmente produzido em estúdio tornou os integrantes do Pink Floyd multimilionários.

Mas não é só isso que torna esta uma das mais espetaculares obras musicais da modernidade. Um experimentalismo inédito até então continua mantendo suas músicas atuais, quatro décadas depois de caprichosamente produzido. Talvez isso explique seu sucesso, por si só. Afinal, num tempo em que a facilidade das mixagens por computador nem sequer era um sonho, os integrantes da banda e o engenheiro de som passaram meses no estúdio entre gravações de sons de relógios, aviões e batidas do coração, cortando pedaços de fita magnética para inserir nos trechos dos instrumentos gravados, numa inédita mistura de experiências sonoras absolutamente incríveis. “The Dark Side of the Moon” é uma experiência sonora única e magnífica.

Mas todo este capricho ainda não explica tudo. Pink Floyd já era uma das bandas mais famosas do planeta quando construiu esta obra. Mas a sua música havia se tornado a trilha sonora preferida para picos e carreiros de pó branco mundo afora. E a banda não queria isso. Numa conversa decisiva, na cozinha da casa do baterista da banda, Nick Mason, na região nordeste de Londres, em dezembro de 1971, decidiu dar uma virada. Não queriam mais ser a banda preferida do mundo psicodélico. Queriam colocar os dois pés na realidade. E Roger Waters empolgou-se, produzindo uma das análises mais fascinantes da condição humana na pós-modernidade em forma de música. Os seus temas: guerra, dinheiro e loucura. O álbum devia ser “a expressão de uma compaixão política, filosófica e humana”, descreveu Waters em 2003, em “The Making of the Dark Side of the Moon”.

E conseguiu. O álbum tornou-se uma obra atemporal, como as grandes obras clássicas da música mundial. Ele se ocupa dos grandes tabus da existência humana. Ou seja, tem os pés no chão. Justamente porque os problemas abordados nos textos de “Time”, “Us and Them” ou “Brain Damage” continuam tão longe de uma solução quanto em 1973. Por isso, coloco acima esta segunda capa de disco. Ela inspirou a capa de Pink Floyd e foi criada por Alex Steinweiss em 1942 para o álbum com o “Concerto para Piano Número 5”, de Beethoven.

Vale a pena curtir, na mais profunda meditação só possível entre as duas pontas de um fone de ouvidos, cada um dos preciosos canais da extraordinária experiência sonora que é este álbum. É uma espiada cristalina sobre o lado escuro da existência humana. Enjoy!

segunda-feira, 25 de março de 2013

Páscoa, o impulso para seguir adiante



Morto no primeiro dia de março do ano passado, já faz um ano que Milton Schwantes nos deixou. A Páscoa me faz lembrar o Milton. Esta última semana de março lembra Jesus, rumo à cruz. A semana iniciada ontem, com a lembrança de Jesus entrando qual rei em Jerusalém, termina numa sequência de trágicos acontecimentos kafkianos, num insofismável madeiro. Ali, naquele caibro, qualquer um se daria por vencido e se entregaria na frase: “Deus meu, por que me abandonaste? Por que me largaste aqui, sem perspectiva?”.

A nova semana depois desta, entretanto, confirma porque Jesus, mesmo em meio ao total abandono e à solidão roçando a pele, não perde a esperança. É Milton quem nos aponta o motivo. Ele descreve a experiência que nasce da mensagem da Páscoa (a partir de Lucas 24): como o mistério da esperança que não nos abandona. Por causa da ressurreição, nós cremos no novo. “Igreja não é necrotério, mas berçário”, proclama Milton. “A ressurreição é como uma cirurgia que devolve a visão”, completa.

É nessa perspectiva que eu vivo esta semana de dores agudas, mas prenhe de esperança. Veja a reflexão bonita de Milton:

“Este é o mistério da Páscoa: vale a pena ir em frente. Estamos aí para crer na esperança. Há futuro. Nas Igrejas, somos células de esperança no novo, pela ressurreição de Jesus. Ele, que saiu vencendo a morte e os matadores, é a nossa esperança de raiz. Igreja não é necrotério! É berçário! Celebra o nascimento da esperança. A morte já se foi. O seu poder minguou, se acabou. Estamos eleitos para caminhar rumo aos horizontes. Jesus nos doou olhos para ver longe. A ressurreição é como se fosse uma operação na vista. Olhos, já sem esperança nenhuma, passam – mortos, doentes, desanimados – a ver. Encantam-se com o colorido das coisas. Voltam a crer em si, a crer nas pessoas próximas, a crer no horizonte.”

sexta-feira, 22 de março de 2013

Armas: a dor que não passa



Os óculos ensanguentados de John Lennon, em foto divulgada 
por sua viúva, Yoko Ono, em protesto contra o uso de armas de fogo.
(Foto: Reprodução/Twitter)

Para protestar contra o uso de armas de fogo, a viúva de John Lennon, Yoko Ono, publicou no Twitter, na quarta-feira dia 20 de março, uma foto dos óculos que Lennon usava no dia em que foi assassinado, e que ainda tem as marcas do sangue do músico. Junto dos óculos ensanguentados, a frase “Mais de 1.057.000 pessoas foram mortas por armas de fogo nos Estados Unidos desde que John Lennon foi baleado e assassinado em 8 de dezembro de 1980”.

Em três postagens do link da foto, Yoko postou mensagens sobre o tema, como esta: “31.537 pessoas são mortas por armas de fogo nos Estados Unidos todos os anos. Nós estamos transformando este belo país numa zona de guerra”. Em outra, ela cita o marido e o filho Sean Lennon: “A morte de um ente querido é uma experiência que deixa um vazio. Depois de 33 anos, nosso filho e eu ainda sentimos sua falta”.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Corredor polonês de chocolate



Detesto ir ao supermercado no tempo da Quaresma. Não, não tem nada a ver com fraqueza, medo de não suportar tantas ofertas e quebrar o jejum ou de atiçar o desejo de consumo. Eu não suporto aqueles “parreirais” de chocolate. Todo supermercado tem um, nessa época. Parecem corredores poloneses – aqueles nos quais se deve passar enquanto recebe tapas e chutes das pessoas que formam o corredor. É mais ou menos isso que acontece comigo nessas “chicanes” de chocolate. Como sou mais alto do que o forro de chocolate dessas cavernas de cacau e açúcar, passo ali tomando petelecos de ovos de chocolate da entrada até a saída.

Mas isso ainda é suportável. Verdadeiramente opressora é a atitude de esfregar o produto na sua cara. Você não tem como escapar. É a opressão absoluta. E eles querem fazer você acreditar que vale a pena comprar o que te ofertam de modo tão obsceno. Porque aquela exibição explícita de chocolate é um indisfarçável atentado ao pudor da oferta e da procura.

Acho que esse exibicionismo todo se dá porque não têm coragem de confessar que cobram vinte ou trinta reais por um ovo de duzentos gramas, sendo que, bem ao lado, você pode comprar a mesma quantia de chocolate em barra, que custa quatro reais. Não é uma diferença absurda? Cadê o PROCON? Ah, dizem os fabricantes, mas tem uma bela embalagem e até um brinquedo dentro! Ainda assim, juntando uma folha de papel celofane (R$ 1,50), com 200 g de chocolate (R$ 4,00) e um brinquedo que pode ser comprado no camelô (vamos optar por um belo carrinho de Hot Wheels, por R$ 5,90), chegamos a R$ 11,40.

Vamos acrescentar aí 50 por cento para compensar a confusão dentro da loja, por conta da época pré-pascal (o que por si só já representa um abuso de poder econômico descarado e absurdo), e vamos chegar ao bom preço de R$ 17,00 por um ovo de Páscoa. E os outros R$ 13,00 (e em muitos casos bem mais de R$ 20,00) são enquadrados em quê tipo de safadeza? Não é um acinte?

DEPOIS DE WORMS, A CAÇADA A LUTERO

No último dia da Dieta de Worms, 26 de maio de 1521, já sem a presença de Lutero, foi decretado o Édito de Worms. O documento fora redigido ...