terça-feira, 26 de maio de 2015

Cultura do estupro no Brasil

Em 2013 o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), dentro de um questionário sobre vitimização no âmbito do Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS), fez também algumas perguntas sobre violência sexual. A partir das respostas, estimou-se que a cada ano no Brasil 0,26% da população sofre violência sexual, o que indica que haja anualmente 527 mil tentativas ou casos de estupros consumados no país, dos quais 10% são reportados à polícia. Isso confere com os registros, que afirmam haver cerca de 50 mil casos de estupro por ano no Brasil.
Agora veja isto: No ano passado, poucos dias depois da divulgação de atos de assédio sexual no metrô de São Paulo e da revelação da existência de uma página intitulada "Encoxadores", no Facebook, o Ipea divulgou dados de uma pesquisa sobre o estupro, segundo a qual 65% dos entrevistados (homens e mulheres) concordaram que mulher que exibe seu corpo, usando roupas curtas e/ou decotadas, "merece ser atacada". A partir dos dados, uma socióloga declarou existir no país uma "cultura do estupro", que considera a vítima responsável pela violência sexual que sofreu.
Segundo a teóloga feminista espanhola Teresa Forcades I Vila, a pressuposição implícita da culpa da vítima que, no imaginário masculino, seduz com sua roupa ou seu comportamento, "contradiz o discurso público sobre a masculinidade". Nega a afirmação de que o homem é o sexo forte. Não resistir a uma mulher vestida de modo sedutor e atacá-la sem seu consentimento, “pressupõe precisamente a debilidade – e não a fortaleza – da subjetividade masculina, de sua liberdade, de seu domínio de si”.
Forcades vai mais longe: “No evangelho de Mateus, em contrapartida, Jesus apresenta uma imagem mais positiva da capacidade ética dos homens (Mt 5.28). Nesta passagem, Jesus pressupõe que o homem tem plena liberdade ante a mulher e que, portanto, sua responsabilidade no encontro sexual não é em nenhum caso inferior ao dela” (trechos do livro “La Teología Feminista em la Historia”).
Ou seja, homem que ataca qualquer mulher (sua companheira de vida ou não!) sem consentimento, não teve domínio suficiente para resistir ou liberdade convincente para promover uma relação desejada pela mulher. Curto e grosso: É um frouxo!

A crise humanitária de proporções planetárias

O desespero leva as pessoas a toparem qualquer coisa. Quando a única perspectiva é um último fiapo de vida livre, lançam-se no abismo de uma possibilidade remota. Qualquer possibilidade. Sem pátria, sem lar, sem comida, sem roupa, sem eira nem beira... e você se joga nos primeiros braços que encontra abertos. E muitas vezes esses mesmos braços são mais traiçoeiros do que armadilha de caça na floresta. Quando se fecham, aprisionam, exploram, ferem mais ainda. A fome e o frio, a noite ao relento, ferem. Mas uma promessa que vira pesadelo, desmonta a própria alma. Torna-se ferida que jamais cicatriza. A promessa falsa que estimula esperança autêntica é pior que ter a escravidão como destino.
Esta é a terrível sinuca de bico em que se metem diariamente milhares de refugiados em todo mundo. E peço desculpas por descrever isto tão superficialmente, confortavelmente sentado aqui, diante do meu computador, numa sala quentinha e seca, com cheiro de café fresquinho vindo da cafeteira fumegante.
Apenas alguns recortes dessa desesperadora crise humanitária:
Os africanos que se atiram no Mediterrâneo, fugindo de não-pátrias atropeladas pelo Estado Islâmico... fugindo da fome e do caos social total, se atiram desesperados ao mar em embarcações precárias. Cerca de três Tïtanics desses refugiados já naufragaram e morreram ali. Esses mortos, porém, tiveram melhor sorte do que os que escaparam com "vida" da viagem do desespero. Ter que afirmar isso, dói. Mas é dramaticamente real. Pior que a morte no mar é a rejeição sistemática. Ninguém os quer. Ninguém se compadece, nem mesmo se importa com o destino de quem não tem mais pátria, nem nada.
Também é a experiência que marcou um grupo de 46 solicitantes de asilo vietnamitas detidos em alto-mar durante um mês pelas autoridades australianas, antes de devolvê-los a seu país de origem. Este grupo foi interceptado em 20 de março de 2015 e detido até 18 de abril e submetido a interrogatórios individuais em alto-mar e investigado. Nenhum foi reconhecido como "refugiado" pelas duríssimas leis de imigração da Austrália, um país feito de imigrantes, que transformou os nativos aborígenes em párias.
Este também é o mundo do absurdo absoluto que marca a descoberta estarrecedora de centenas (talvez milhares) de corpos enterrados em valas comuns nas montanhas, próximos a campos de refugiados implantados pelo tráfico humano na Tailândia. Com a repressão que se seguiu à terrível descoberta, os traficantes abandonaram as embarcações no mar e deixaram centenas de migrantes à deriva, o que provocou o caos na região. Malásia, Indonésia e Tailândia se recusaram a receber os migrantes e acabaram por ceder à pressão internacional e passaram a oferecer abrigo temporário.
A ONU calcula que 2.000 pessoas permanecem à deriva no mar, em um momento crítico, a poucas semanas do início da temporada de chuvas de monção. Nas últimas duas semanas, mais de 3.500 pessoas chegaram às costas da Indonésia, Tailândia e Malásia. Os migrantes são bengaleses que fogem da miséria em seu país e integrantes da comunidade muçulmana rohingya, marginalizada em Mianmar e sem direito à cidadania no país. E, o pior: gente absurdamente sem escrúpulos fazendo negócios com essa massa humana desesperada.
A lista deve incluir também os haitianos que migram para o Brasil, entrando pelo Acre em condições desumanas e jogados daqui para lá e de lá para aqui como pelanca no balcão do açougue da humanidade. Eternos esmoleiros, pressionados pelo desemprego alguns deles não veem saída a não ser retornar ao destroçado Haiti. Onde quer que aportem, os rostos se viram e os olhares se desviam. O mundo vira solenemente as costas ao Haiti desde 2010, ano em que o terremoto destrocou a economia haitiana. É o mesmo mundo que fez um Plano Marshall para recuperar a Alemanha destroçada pela segunda guerra mundial, mas não é capaz de devolver o Haiti a condições mínimas que permitam a esperança e a reconstrução.
A humanidade é sórdida.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Dom Óscar Romero e os santos

Óscar Arnulfo Romero Galdámez é um mártir de cristo na América Latina. Seu martírio foi precedido da condição de profeta. Ergueu sua voz para defender o povo de El Salvador da tirania dos poderosos. Tratou o povo simples como "pequeninos irmãos" e sua voz profética em defesa do povo ecoa até hoje através dos vales de lágrimas da injustiça que ainda corre solta pelo nosso continente. E fez a sua defesa incondicional dos pobres e do povo através dos instrumentos da não-violência ativa, sendo comparado a Mahatma Gandhi e Martin Luther King.
Por ser profeta, por clamar contra a injustiça, por defender o povo injustiçado e oprimido em plena guerra civil salvadorenha, Dom Óscar Romero foi covardemente assassinado durante a missa, em San Salvador, no dia 24 de março de 1980. Foi arcebispo da capital salvadorenha por pouco mais de três anos.
Dom Óscar Romero é um legítimo mártir da paz. Mas não daquela paz que não se envolve, que se retira das lutas e que se isola sem compromisso. O seu compromisso com a justiça e a igualdade a torna uma paz de enfrentamento, que martiriza. A paz que oferece a outra face, é aquela que chama a violência para si, absorvendo-a em defesa das vítimas.
Assim, o mártir da paz, da América Latina, de El Salvador entra para a lista dos santos mártires da igreja, sendo beatificado no sábado, dia 23 de maio. Sua santidade lhe advém da ousadia de ter levado seu batismo (que torna todos os cristãos santos, segundo Lutero) a sério e ter vivido sua fé até a última consequência, pagando sua fidelidade ao evangelho com a própria vida.
Óscar Romero encaixa-se com perfeição no papel que Martim Lutero reservou aos santos da igreja em todos os tempos: Eles são exemplo, pois a sua vida e obra apontam para Cristo como o único mediador e salvador. Os santos são inspiração para a nossa fé e a vida deles tem a função de oleiro para moldar o barro da nossa vida.
Óscar Romero é oleiro que nos molda e desafia a não mediocrizar nossa fé numa preocupação egoísta pela nossa salvação pessoal. Óscar Romero aponta para a nossa missão profética neste mundo, demonstrando que a fé não combina com injustiça, com ausência de paz, opressão, exploração e dor. Óscar Romero, segundo a compreensão de Lutero, "impulsiona Cristo", com a sua vida e com o seu martírio.
Com sua beatificação, ele entra para a lista dos mártires cristãos do século 20, como Dietrich Bonhoeffer e Martin Luther King; mas também para a lista dos santos que Deus escolheu sem a igreja, como Mahatma Gandhi, por exemplo.

terça-feira, 19 de maio de 2015

Tudo pela audiência

Não, não! Não me refiro àquele programa engraçadinho do Multishow (que, aliás, faz tudo mesmo pela audiência, como abusar de pessoas fisicamente fora do nosso esquálido conceito de beleza, por exemplo). Falo é do velho Jornal Nacional, o JN. 
Agora deram para tentar sair do jurássico padrão Repórter Esso, mais engessado que perna quebrada. Querem imitar o bem-sucedido Jornal Hoje na descontração e nos apresentadores desfilando por um mundo que mais parece ter saído de cenários da ficção de Hollywood. Mas não deu muito certo. 
Bonner está muito mais para Heron Domingues (Repórter Esso). Por mais que se esforce, não tem a desenvoltura de um Evaristo Costa (Jornal Hoje); não para improvisar comentários sobre as notícias. 
Veja a grande bobagem que Bonner fez na segunda à noite (Não assisti, porque faço parte dos 70% da não-audiência do JN). Por este caminho, vão perder mais um terço da audiência rapidinho. 
Para terminar, dou um conselho de graça ao Bonner: Você quer recuperar a audiência do JN? Tente começar a falar a verdade! Quem sabe, quando pudermos acreditar novamente em vocês, voltemos a fazer o JN bombar no Ibope!

DEPOIS DE WORMS, A CAÇADA A LUTERO

No último dia da Dieta de Worms, 26 de maio de 1521, já sem a presença de Lutero, foi decretado o Édito de Worms. O documento fora redigido ...