quinta-feira, 24 de novembro de 2016

CHARIS (χαρις)

O termo grego χαρις aparece 158 vezes nos livros do Novo Testamento. É um verbete central do Evangelho, com destaque para a Teologia do Apóstolo Paulo, e tem significado inalienável para o luteranismo. χαρις é "graça". Segundo Lutero, nossa redenção é pura χαρις (graça) de Deus.
Por esse caminho etimológico (etimologia é a ciência que estuda a origem das palavras), χαρις é algo que nos é dado sem que nada seja cobrado em troca. Assim a χαρις (graça) que produz a nossa salvação não se encaixa em nenhuma matemática. Não existe calculadora em condições de calcular a χαρις de Deus consumada em Cristo.
χαρις deu origem a termos conhecidos da nossa língua portuguesa, como CARIdade e CARIsma. O termo grego χαρις tornou-se "gratia" no latim, o que contribui para que nem sempre percebamos a etimologia das palavras a que χαρις deu origem.
"CARIdade" é algo que você faz por doação, "por" graça e "de" graça, sem colocar na ata da sua vida como algo a ser cobrado mais tarde.
"CARIsma" é uma capacidade ou habilidade que você recebeu, que lhe foi dada. Por isso, é um DOM, algo que lhe foi dado. E é bom que fique claro que você o recebeu sem merecimento. Não existe meritocracia na χαρις!
Assim, é de lamentar que no termo CARISmático o uso do verbete se resuma a classificar um grupo de cristãos pelo uso de "dons" específicos como o de falar em línguas ou de cura, o que muitas vezes é visto como um privilégio ou um dom especial dado a cristãos que são mais e melhores do que os outros. A χαρις de Deus não usa esse tipo de classificação. TODOS e TODAS são agraciados (olha o termo GRATIA aí!) com dons. É só descobrir e usar o seu!
Por isso, GRATIA produz GRATIDÃO. Seja agradecido! Seja agradecida! Hoje é o Dia Nacional de Ação de Graças. Aproveite para usar seu CARIsma e fazer CARIdade.
Que Deus abençoe o seu dia!

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Muros na prancheta

No dia 9 de novembro de 1989, uma avalanche de gente derrubou o muro mais emblemático da história da humanidade. Muitos outros haviam sido erguidos e derrubados até então, como a muralha de Jericó (derrubada por trombetas), o muro de Jerusalém (destruído), a muralha da China (virou atração turística)...
Mas nenhum foi simbolicamente tão global e impactante quanto o muro de Berlim. Ele inverteu a simbologia dos muros, já que no passado eles serviram para proteger as cidades. O muro de Berlim sitiou uma cidade inteira durante décadas, dentro do território inimigo. Intermináveis negociações e muita ousadia diplomática levaram à sua queda há 27 anos passados.
Hoje, 27 anos depois, a eleição de Donald Trump como 45º presidente dos Estados Unidos da América eleva ao posto mais alto da humanidade um construtor de muros.
De onde vem esta força maligna que legitima o discurso dos construtores de muros tantos anos depois? E justo do lado dos que contam entre suas maiores conquistas a vitória numa guerra que derrotou o fascismo europeu?
Que lições aprendemos, afinal, se é que somos capazes de aprender alguma lição? A história nos mostrou onde este caminho pode levar. E lá vamos nós e reerguemos das cinzas toda a sordidez de que a humanidade é capaz, acreditando que, desta vez, não haverá risco. Pobres de nós.
No meio da escalada ao poder de um belicoso projetista de muros, relembrar e celebrar a queda do muro de Berlim, afinal, parece uma piada de mau gosto... Quem foi que disse "nunca mais"? Veremos. Os primeiros traços já estão desenhados na prancheta.

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Jörg Zink morre aos 93 anos
Sei que, mais uma vez, escrevo um texto longo, que poucos irão ler. Mas não tem como ser diferente. Entre formador de opinião e um homem de Deus de múltiplos dons e capacidades, que falou dos grandes temas da fé para a atualidade, Jörg Zink é dos grandes da Cristandade. Saiba porque, abaixo.
Jörg Zink está entre os grandes escritores do século 20. Suas obras espalharam-se por todo o mundo, em dezenas de traduções. Destaque foi a sua tradução particular do Novo Testamento e de seleções do Antigo Testamento, que levou o texto bíblico de forma nova e pessoal a milhões de pessoas. Sua extensa obra literária reúne mais de 200 livros, com uma tiragem total de 20 milhões de exemplares.
Filósofo, teólogo, pastor e relações públicas, Zink foi jornalista, escritor, produtor e apresentador de TV, e formador de opinião sobre temas atuais. Ele nasceu na Alemanha em 1922 e foi um dos principais articuladores da paz mundial e pioneiro do debate ecológico. Seu nome está inscrito entre os fundadores do Partido Verde da Alemanha (Die Grünen), ajudando a transformá-lo de um grupo de protestos em opção política de peso.
Durante duas décadas ele foi um apreciado apresentador de televisão, com programas como Wort zum Sonntag (Palavra para o Domingo), no canal ARD e outros. Também foi frequente palestrante nos Dias da Igreja na Alemanha. Sua última participação foi em 2011 numa tela gigante, pois estava impedido de comparecer pessoalmente por conta de uma cirurgia.
Também foi produtor de 40 filmes sobre os países do Oriente Médio, falando de história da religião e de sua cultura. Além de autor de letras de muitos hinos, ele também era engajado socialmente em diversas frentes, entre outros pela inclusão. Recebeu o prêmio Protetor Nacional da Natureza, o prêmio de pregador pelo conjunto de sua obra e muitos outros.
Para a Igreja Evangélica de Würtemberg, onde ele atuou, Zink foi um dos grandes comunicadores do evangelho. Sua obra contribuiu decisivamente para o fim da era das grandes guerras, da injustiça social, da exploração da natureza e dos conflitos religiosos. Fez tudo isso com mensagens diretas, simples, compreensíveis e que também chegavam bem a pessoas sem formação teológica.
De sua extensa biografia consta também a direção de um instituto de formação para jovens, cultura e serviço social na Casa Burghardt em Gelnhausen (1957-1961), duas décadas como responsável pela comunicação e atividades televisivas de sua igreja territorial e, desde 1983, como relações públicas independente. Jörg Zink faleceu no dia 9 de setembro em sua casa em Suttgart, aos 93 anos, deixando a esposa Heidi e quatro filhos com suas famílias.

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Blumenau Farroupilha


A construção da Estrada de Ferro Santa Catarina trouxe os primeiros "forasteiros" a Blumenau. Vieram para cavar o leito da EFSC, deitar os dormentes e prender os trilhos sobre eles. A construção da bela ponte de ferro, no centro da cidade, também fez surgir a primeira favela de Blumenau. Na cabeceira da ponte em obras, surgiu um agrupamento de casebres em terra invadida, pejorativamente denominado de “Farroupilha”. Com a estrada e a ponte prontas, foram ficando e faziam os piores serviços na “cidade jardim”. Aos domingos, eram uma animada torcida do Palmeiras, clube de futebol dos moradores da "Palmenstrasse", a rua das palmeiras plantadas pelo Dr. Blumenau.
Mas aquela mancha desordenada de barracos de pau a pique e ruas feitas com pás e picaretas em barrancos íngremes incomodava. O dono do terreno já havia entrado na justiça diversas vezes para tentar sua remoção. O centenário da orgulhosa cidade se aproximava, e a Farroupilha não podia permanecer ali para os festejos. Assim em 1949, um ano antes do centenário, a prefeitura empenhou-se em relocar aquela exibição farrapa em pleno centro.

O primeiro “zoneamento” do município jogava para longe dos olhos um problema habitacional que surgia no rastro da pujança do município. A lei foi assinada pelo memorável prefeito Frederico Guilherme Busch Jr., em seu segundo de três mandatos (1947-1951). A Farroupilha foi transportada de mala e cuia para o Beco Araranguá e o que é hoje a Rua Pedro Krauss Sênior.
A orgulhosa Blumenau podia comemorar seu centenário com a cabeceira da ponte livre da Farroupilha e receber com distinção os descendentes do Dr. Blumenau. Vieram receber as merecidas honrarias pela bela cidade que seu pai e avô havia fundado à beira de um rio exuberante. Desde então, a loira Blumenau aprendeu a amar os meios-fios das calçadas do centro caiados de branco.
Enquanto comemoravam 100 anos de conquistas, mal suspeitavam os blumenauenses que a relocação da Farroupilha acabasse por criar o maior problema do futuro da cidade, a regularização fundiária: a ocupação desordenada em áreas de risco e invasão de reservas ambientais. Quem conhece o Beco Araranguá sabe do que eu estou falando. O “longe dos olhos”, que colocou para fora da vista das belas tardes do Tabajara Tênis Clube uma mancha indesejável, expôs de maneira dolorosa o que significa varrer a sugeria para debaixo do tapete.
Estou entre os que divulgam essa história para que a Farroupilha não seja também varrida para debaixo do tapete da história e desapareça da memória coletiva de Blumenau.

quarta-feira, 15 de junho de 2016

Idosos maltratados


No Dia Mundial de Conscientização da Violência contra a Pessoa Idosa, é necessário apontar para o crescimento desse tipo de crime. O Brasil, como todos os demais países que iniciam um processo de declínio da curva de crescimento populacional, torna-se rapidamente um país de gente idosa. Conforme relatório da Organização Mundial de Saúde, a porcentagem de pessoas com idade acima dos 60 anos no país cresce acima da média mundial. Até 2050 o número de idosos deve triplicar no Brasil.
O que diminui com o aumento do número de pessoas idosas é a paciência dos mais jovens com elas. Velho é peso. Velho é estorvo. Velho devia morrer mais cedo.
O assunto foi meio que varrido para debaixo do tapete em meio à crise institucional brasileira. Mas não deixou de existir por isso. O Disque 100, que foi criado em 1997 para receber denúncias de violência contra crianças, desde 2011 está também recebendo denúncias de violência contra pessoas deficientes e idosas. No caso das pessoas idosas, as denúncias aumentaram 195% em 2012 só no Paraná, e no ano seguinte mais 75%.
Violência não é só bater ou humilhar. Há numerosas maneiras de violentar uma pessoa idosa, confiscando sua aposentadoria, confinando-a num quarto insalubre nos fundos da casa ou do rancho, deixando-a numa solidão desoladora enquanto o resto da família passa o dia fora (ainda mais quando preso à cama ou a uma cadeira de rodas), não tratando devidamente de seu bem-estar físico e psicológico. Nem falo de um asilo, pois lá quase sempre ela terá tratamento condizente. E a coisa vai por aí. Tudo pode ser resumido na palavra ABANDONO, que tem em sua raiz o verbo "to ban" (inglês), que significa "banir".
A Bíblia recomenda respeito à pessoa idosa. A lei de Israel diz: “Fiquem de pé na presença das pessoas idosas e as tratem com todo o respeito” (Lv 19.32). Paulo diz a Timóteo: “Não repreendas asperamente ao homem idoso, mas exorta-o como se ele fosse seu pai” (1 Tm 5.1). O Conselho dos Anciãos era o círculo de poder mais respeitado na antiguidade em diversos povos, sendo um dos últimos recursos para deliberar questões polêmicas ou jurídicas.
Cabe também à igreja cristã olhar com atenção esta questão. Não esqueçamos que, para o bem ou para o mal, as pessoas idosas são grande parte de nossas comunidades ativas. As crianças rareiam. Os adultos estão atarefados demais. São as pessoas com tempo livre, na aposentadoria, que formam o grosso da membresia ativa de nossas comunidades. Então, nada melhor que tratá-los com carinho e cuidado.

sexta-feira, 10 de junho de 2016

Ouso corrigir o Castelo Forte

Hoje é um dia especial para mim e para todas as ministras e os ministros da igreja cristã. Minha homenagem a todas as e todos os colegas. Subir num púlpito, missionar ou ensinar não é fácil numa sociedade líquida, em que mudar de opinião também segue os ditames do consumismo e da moda. Por isso, não se trata de modismo, mas a Igreja precisa adaptar sua linguagem a um mundo que muda todos os dias, para falar ao coração das pessoas com clareza. E nós, mulheres e homens dos ministérios, estamos diariamente diante deste desafio gigante!
Às vezes, a dureza da linguagem e o exagerado apego a detalhes da tradição atrapalham a igreja. Por isso, não posso deixar de compartilhar estas duas fotos com um sentimento de frustração. São fotos do devocionário Castelo Forte, na página da meditação para o dia de hoje. Foram tiradas por mãos de mulher. Este dedo de bem decorada unha é da pastora Beta Lieven, ministra da IECLB. Com razão, ela protesta em sua página do Facebook contra o texto e a chamada (esquecimento ou intenção, não sei...) para o dia DO PASTOR, voltada apenas para os homens. Não vou entrar em detalhes aqui sobre a parceria de duas igrejas luteranas que produz o Castelo Forte, uma das quais rejeita as mulheres pastoras (às vezes de forma ostensiva).
Afirmo apenas que não é somente uma questão de linguagem inclusiva. Dói! É como se todas as pastoras e ministras fossem deliberadamente empurradas para fora dos altares das igrejas. É como se o maior devocionário do mundo luterano brasileiro afirmasse a elas: "Sentem-se aí na fila dos bancos e calem-se!". Assim, eu ouso CORRIGIR esta página do Castelo Forte.

DIA DO PASTOR E DA PASTORA
Ou, como bem disse a Valmi Becker, "Dia da Ministra e do Ministro"
1 Coríntios 16.1-12
O texto fala dos dons espirituais, comparando a igreja a um corpo humano. Aponto com o dedo os versículos 4 e 5, que falam da diversidade de DONS e diversidade de MINISTÉRIOS. Insisto que o Espírito inclui as MULHERES entre as pessoas agraciadas pela multiformidade dos dons espirituais e também de TODOS os ministérios da igreja, a saber: missionário, catequético, diaconal e PASTORAL! Vamos tirar do nosso caminho (e dos nossos corações) esta pedra do machismo eclesial. No dia de hoje, eu proclamo: FALEM, MULHERES! VOCÊS TÊM MENSAGENS LINDAS E A IGREJA QUER OUVIR VOCÊS!

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Refugiado Político na Origem

Imagem: Martim Lutero é sequestrado e levado à Wartburg

A Reforma Luterana tem uma forte ligação com a figura do asilo político. Assim que Martim Lutero disse que, "por razões de consciência" ele não podia renegar seus escritos, ele subiu o último degrau do que no século 20 passou a ser conhecido como "desobediência civil", que é uma forma de protesto político, feito pacificamente, que se opõe a uma ordem injusta e repressora.
Como resultado do que o imperador Carlos V e a Igreja consideravam uma insolência, veio a proscrição. O monge insolente perdeu a bênção da igreja e a proteção do estado. Só um asilo político poderia salvar a sua vida. Qualquer um que o matasse, nem seria chamado a depor. Talvez fosse ainda homenageado com uma medalha...
O asilo político de Martim Lutero veio com o seu sequestro. Ele, é claro, pensou que o seu fim havia chegado. Mas, seus sequestradores eram enviados pelo Príncipe Frederico, para salvá-lo de ser morto a pauladas, como uma serpente que surpreende um caminhante à beira da estrada.
Durante mais de um ano, Lutero foi um refugiado político no Castelo de Wartburg. Assim, foi ali que ele traduziu o Novo Testamento e organizou as suas ideias cuidadosamente. O movimento da Reforma tem em sua origem um forte ingrediente ligado aos direitos humanos e à condição de refúgio político. Portanto, 500 anos depois, em meio à maior crise de refugiados da história humana, a experiência de Lutero nos ilumina e inspira. (CHL)

quarta-feira, 1 de junho de 2016

O Cristianismo e o Homem de Aço


Você sabia que o verdadeiro nome de Stalin (1927-1953) era Georgier Josef Wissarionowitsch Dschugaschwili? O apelido “Stalin” era seu nome de guerra, e vem de Stal=Aço, ou seja, "homem de aço". A imagem que se via ao encontrá-lo, entretanto, não corresponde nadinha com a desta foto, propositalmente tirada de baixo para cima para dar a impressão de grandiosidade. Com uma estatura de 1,62 metro, o presidente americano Harry Truman o chamava de “Three Cheese High” (em alemão “Drei Käse Hoch”, ou “Baixinho”), algo como o pequeno príncipe real do filme “Shrek”.
Este baixinho invocado espalhou o terror estatal pela União Soviética contra todos os seus opositores. Milhões morreram em campos de trabalhos forçados durante sua limpeza política. Outros milhões morreram de fome por conta de suas reformas econômicas mal planejadas. O pequeno malvado Stalin era um monstro de aço contra quem quer que atravessasse o seu caminho.
Joseph Stalin era um ditador implacável, que desonrou o socialismo e manchou para sempre a luta pela igualdade. Assim, não é historicamente honesto citar Stalin sempre que se toca em qualquer tema ligado a conquistas sociais dentro ou fora do cristianismo. A divisão justa e igualitária é um princípio fundamental da fé judaico-cristã e a Bíblia não é “comunista” por isso. Quem acusa cristãos que lutam por justiça social de comunistas, incorre em gravíssimo erro teológico e histórico.
Tanto que temas como um ano sabático para a terra (Levíticos 25) era lei no antigo Israel desde o Monte Sinai. A cada sétimo ano, ninguém plantava e o que os campos produziam espontaneamente era dos pobres, das viúvas e dos animais. A maioria da população devia armazenar nos outros seis anos para deixar a terra descansar no sétimo ano.
Também a tão odiada reforma agrária está na Bíblia. “A terra não se venderá em perpetuidade, porque a terra é minha; pois vós sois estrangeiros e peregrinos comigo” (Levítico 25.23).
O amor aos “pequeninos irmãos”, estabelecido por Jesus Cristo como um critério para separar os salvos dos perdidos no dia do juízo (Mateus 25.31ss), nada tem a ver com Stalin ou com o comunismo que ele impôs ao povo soviético. Qualquer confusão entre essas duas visões de mundo é forçar a barra e buscar argumentos equivocados para atacar cristãos que defendem a justiça social e o amor aos pobres. Etimologicamente, socialismo vem de “social”, e comunismo vem de “comum”, a mesma raiz da palavra "comunidade". O “comunismo”, no sentido bíblico, vem da expressão de atos dos apóstolos: “e todos tinham TUDO EM COMUM” (Atos 2).

segunda-feira, 30 de maio de 2016

Indulgências e negócios

As indulgências são uma antiga prática na igreja. A palavra indulgência vem de "indulto", que tem múltiplos significados dentro do espectro do "perdão" (desde o perdão de culpa até redução de pena ou de impostos, concedidos por uma autoridade).

A indulgência é um indulto concedido pela autoridade eclesiástica a algum pecado específico. Implica em confissão e penitência e é uma prática legítima. A bênção "Urbi et Orbi" tem embutido um indulto universalproferido pelo papa. Na teologia católica a igreja tem autoridade, concedida por Cristo, para perdoar pecados.

Lutero concordava com isso e este conceito é parte da confessionalidade luterana até hoje. Em seu "Catecismo Menor", Lutero explica no terceiro artigo do Credo Apostólico: "Nesta Igreja ele perdoa, cada dia e plenamente, todos os pecados a mim e a todas as pessoas que creem".

O que Lutero e o movimento da Reforma condenou, foi o COMÉRCIO das indulgências. Este comércio visava lucro e negociava com o perdão da igreja. João Tetzel, um dos principais mascates de indulgências no tempo de Lutero, agia em nome de um bispo que precisava juntar dinheiro para pagar sua dívida junto aos Fugger, os maiores banqueiros da Europa na época. O que sobrava ia para Roma, para construir a Catedral de São Pedro.

A doutrina das indulgências entrou injustamente em desgraça na idade média tardia por causa do comércio das indulgências. Este comércio foi oficialmente proibido pelo papa em 1562, em parte graças ao empenho dos reformadores e da contra-reforma. Mais do que proibido, desde então o comércio com a graça de Deus era motivo para excomunhão.

O moderno comércio com a salvação, praticado pela teologia da prosperidade de inúmeras igrejas neo-pentecostais, é uma volta ao comércio de indulgências. Pastores inescrupulosos fazem negócio, colocando alto preço na graça de Deus. A graça não está à venda, diz o tema da IECLB de 2016.

segunda-feira, 23 de maio de 2016

Credo Para os Nossos Dias

Eu creio em Deus.
Mesmo que não o veja, eu posso senti-lo em mim.
Ele criou todas as formas de vida do jeito que são.
Ele não é só um Deus das pessoas,
mas também dos animais e das plantas.
Ele sempre está aí para nós.
Percebe que há muita coisa errada neste mundo
e faz de tudo para que isso não continue assim.
Eu creio em Jesus Cristo.
Ele tinha compreensão com as pessoas.
De modo especial, ele se dedicava aos pobres
e se empenhava pelas pessoas excluídas.
Ele mostra a todos e todas nós
como podemos conviver numa boa.
Ainda hoje eu posso falar sempre com ele e pedir conselho.
Ele morreu por todas as pessoas e viveu do jeito que Deus quer.
Ele ressuscitou e está com a gente sempre.
Eu creio no Espírito Santo.
Ele nos abre os olhos para as outras pessoas
e nos anima ao engajamento por paz e justiça neste mundo.
Ele está em todo lugar e com todas as pessoas;
não somente dentro da igreja.
(Texto de uma confirmanda)

Nossa coroa está por um fio


Ontem (10 de maio) a Nasa anunciou a descoberta de 1.284 planetas pelo telescópio espacial Kepler. Com esses, o número de planetas sobe para 3.264. Agora já são 21 os “exoplanetas” que orbitam na zona habitável de seu sol, ou seja, na distância com temperaturas que permitam a presença de água em estado líquido e, portanto, vida. O telescópio descobriu ainda 550 planetas rochosos como a Terra. O telescópio espacial lançado em 2009 já colheu dados de 150 mil estrelas. Kepler detecta variações de luz que indicam a passagem de planetas por estrelas, durante sua órbita.
Os resultados da pesquisa sugerem que possa haver mais de 10 bilhões de planetas potencialmente habitáveis no Universo. Aí eu fico a pensar com meus botões: E agora, Adão? Tua solidão, afinal, pode não ser tão solitária assim! Pelas contas da Nasa, existe um planeta e meio para cada habitante desta Terra, em que orgulhosamente viajamos pelo Universo – supostamente solitários. Se em dez por cento deles houver ao menos uma civilização parecida com qualquer dos estágios civilizatórios pelos quais já passamos por aqui (ou talvez mais adiante já), então teremos UM BILHÃO de “humanidades” girando por aí. Exagero, OK! Mas se ficarmos só nos 21 até agora descobertos que têm condições de ter água e vida e aplicarmos os mesmos dez por cento, então teremos ao menos dois planetas que podem ter uma humanidade qualquer vagando no horizonte distante... Foi-se a nossa pretensa coroa de “imagem e semelhança de Deus”!

Perguntas e Respostas

Há um momento sublime no encontro entre duas pessoas, que é a suspensão completa da tagarelice. Silêncio litúrgico. Encontro total, em aceitação e respeito plenos. Nada de perguntas. Nada de respostas. Por que as respostas são tão imprescindíveis, inadiáveis, inolvidáveis? Malditas as perguntas que não querem calar! Por que tantas perguntas que eu não posso, não sei e não quero responder? Pior que as suas perguntas é a minha própria necessidade de ser inquirido. Por isso, vou esforçar-me para não dizer "você deve estar se perguntando...". Vamos combinar assim, eu não lhe faço perguntas e você não exige de mim respostas. Vamos permanecer apenas caminhando e contemplando. Eu sendo plenamente eu, você completamente você. Vamos seguir assim, lado a lado, em silêncio, seguidos apenas por nossas pegadas... 

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Vamos acabar todos cegos

"Olho por olho, e acabaremos todos cegos". Esta frase de Gandhi faz referência à lei do Talião, que consiste na rigorosa reciprocidade entre crime e pena, apropriadamente chamada retaliação.
O Antigo Testamento explica em detalhes como ela funciona: "Mas se houver morte, então darás vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe (Êxodo 21.23-25).
A justiça moderna rechaça a lei do talião. As penas previstas em lei para os crimes não se baseiam na retaliação pura e simples. Embora a pena de morte seja praticada formalmente em mais de 20 países, mais de 90 a rejeitam totalmente.
O Brasil praticou a pena capital regularmente até a proclamação da república. Embora tenhamos assinado o protocolo de abolição dessa pena, ela ainda está na nossa lei em caso de crime de guerra, veja só.
Mas, o que me leva ao tema é a dramática constatação de que no ano passado a Pena de Morte bateu um novo recorde. A lei do Talião volta com toda força no mundo. As execuções de condenados à morte cresceram mais de 50% em 2015 e somaram 1.634 casos, o número mais alto em 25 anos, segundo relatório da Anistia Internacional (AI) publicado ontem (05/04/2016). Apenas três países, Irã, Paquistão e Arábia Saudita concentraram quase 90% das penas capitais aplicadas no mundo.
No Irã foram executadas 977 pessoas, no Paquistão, 326, e na Arábia Saudita, 158. Os julgamentos muitas vezes são parciais e condenam inocentes à morte, em nebulosos casos de adultério, insultos ao Profeta e apostasia, segundo observadores da AI. Também há milhares de casos na China todos os anos, onde o número dos executados é segredo de Estado.
Ainda segundo a AI, em 2015 foram pronunciadas mais 1.998 sentenças de pena de morte no mundo. Embora os países que adotem a pena capital sejam minoria e estejam cada vez mais isolados, a situação preocupa.
Para mim, vale o que determinou Jesus no sermão do monte: "Ouvistes que foi dito: Olho por olho, e dente por dente. Eu, porém, vos digo que não resistais ao mau; mas, se qualquer te bater na face direita, oferece-lhe também a outra; e, ao que quiser pleitear contigo, e tirar-te a túnica, larga-lhe também a capa; e, se qualquer te obrigar a caminhar uma milha, vai com ele duas. Dá a quem te pedir, e não te desvies daquele que quiser que lhe emprestes" (Mateus 5.38-42).
Como diz o lema do ano da IECLB, "Buscai o bem e não o mal" (Amós 5.14a).

quinta-feira, 17 de março de 2016

O país do grito


Em um dia qualquer de setembro, cerca de dois séculos atrás ou pouco menos, surgia uma insólita nação. Registra a história oficial que um grito forjou o tal país. Foi assim...
Um príncipe infante, deixado para trás por uma família real suja e desmanzelada, de uma corte hilária e insignificante, devia reger um potentado que, à semelhança de um filhote de elefante, mal sabia o tamanho do próprio corpanzil. O menino-príncipe-regente fazia as vezes de mandatário de 22 capitanias hereditárias precariamente aglutinadas em torno de um inchado e voraz formigueiro real, onde se fingia reinar sobre um reino de gambiarras.
Em busca de conhecer o projeto de país que herdara da corte familiar fujona, que o deixara na penúria ao limpar os cofres do banco real, o príncipe de barba cheia em franco desenvolvimento montou em lombo de mula para conhecer a sua herança. Entre insetos e serpentes, onças, pacas, antas e capivaras, sendo observado por bandos de monos do alto de florestas impenetráveis, nosso amado primeiro herói fabricado, ainda menino, tornara-se desbravador do próprio chão.
Enquanto esfregava suas jovens partes baixas no lombo da mula que na história virou garanhão napoleônico, não lhe ardia somente o tesão juvenil da explosão hormonal que acompanha todos os jovens de 22 anos, mas lhe devassava uma monumental disenteria.
A viagem de exploração do reino virou uma trilha de desespero intestinal. O adolescente-príncipe-regente sentia-se um farrapo humano com cheiro de bosta em meio a um futuro país que sequer lembrava vagamente a corte que deixara para trás, onde os escravos negros tinham fios brancos nas costas dos pingos da bosta do castelo em que ele havia se tornado um quase-homem ainda ontem. Ali, em meio ao inóspito tudo, até isso era com ele: realizar seu próprio saneamento básico.
De moita em moita, apelando para folhas mas mantendo distância segura de urtigas, uma folha de papel com timbre real viria bem. E ela veio pelas mãos de um fatigado e esfaimado mensageiro. O rei-pai-sujo-obeso-fujão ordenara submissão ao jovem imperador tornante.
Com a garganta seca e a saída em brasa, o príncipe enfureceu-se com a inesperada mensagem que, embora não registrado em imagens ou livros de história, deve ter acabado numa parte do príncipe a derreter.
Indignado, ele foi no grito. Uivando de ódio e de cólicas, mandou o pai e sua corte ao lugar que estava bem abaixo dele e que há pouco fazia parte de suas dores. O grito do príncipe entrou para os anais como "Grito do Ipiranga".
Surgia, ali mesmo, o país do grito. Desde então, tudo nesse país é feito no grito, resolvido no grito, abafado no grito ou mesmo prendendo o grito. Grita-se por tudo e para todos. Diálogo é grito, educação é grito, escola é grito, governo é grito, oposição é grito, protesto é grito, justiça é grito. No país que surgiu às margens do Ipiranga, cujas margens ecoaram o grito de ódio do futuro imperador, foi criada a gritocracia. E este é o modus operandi da política nacional desde então. O grito fundante, das margens do Ipiranga, continua a ecoar no Legislativo, no Executivo e até no Judiciário.
Me perdoe Pedro Américo e seu descarado plágio mentiroso das origens do país do grito às margens do Ipiranga. Seu quadro napoleônico não representa o que nos tornamos. Dragões da independência em animais de raça ao redor de um arrebatador príncipe destemido, erguendo as espadas num prenúncio de Star-Wars tupiniquim? A mentira é o berço do país do grito. Uma trupe esfarrapada seguindo um adolescente em estado de cólera e torturado pelas picadas dos insetos, todos montados em mulas e odiando cada parada seguida de um insuportável fedor... É daí que nascia o país do grito. Seguimos gritando. Quem mais pode, quem mais tem peito. Enquanto gritamos, todos estão surdos... Por isso, o quadro que melhor representaria nossas origens é o de Edvard Munch. 

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

O que precisa ser dito sobre a crise dos refugiados

A decisão absurda da Dinamarca de confiscar dinheiro dos refugiados colocou uma pulga na minha orelha. Dei um Google sobre a colonização da África e descobri este mapa de como a Europa havia dividido o continente entre si no século 19. Ali começou a crise africana, pois nada respeitaram, nem mesmo tribos inimigas. Arrancaram tudo que podiam em pouco mais de meio século e deixaram um rastro de sangue, devastação e morte.
Entre os que mais lucraram com esta divisão da casa alheia estão a França, a Alemanha, a Inglaterra. a Itália e a Bélgica (portugueses e espanhóis fizeram a sua maldade em outros tempos). Agora, só a Alemanha parece disposta a reparar ao menos um pouco os danos causados, recebendo os refugiados em massa (embora com crescente revolta interna). França, Inglaterra e Bélgica resistem como cães ferozes à onde migratória dos refugiados africanos, embora tivessem enriquecido explorando aquela gente.
E a Dinamarca? Ela não consta desta lista de colonizadores. "Mas eles também estiveram lá", pensei comigo. Bingo! Eles foram os pioneiros e exploraram Gana e região a partir de 1660 por 200 anos e mantiveram entrepostos em solo africano que depois foram vendidos aos ingleses. Um desses postos avançados dos belgas é o palácio presidencial de Gana nos dias atuais. Então, pior do que os outros, que não reconhecem os estragos feitos no passado, os belgas querem explorar esta gente miserável pela segunda vez. É coisa para um tribunal internacional.
O resumo dessa tragédia é que não é verdade que a África é um continente esquecido por Deus. Na verdade, a África foi a eterna mina a céu aberto dos europeus. Agora eles se fingem de bonzinhos em ajudar alguns deles, fazendo de conta que têm um coração grande. O que têm, é memória curta. Faz menos de um século que arrancaram até o sangue daquela gente. Inclusive as graves crises ambientais africanas têm sua origem naquela inescrupulosa colonização. A fome de hoje é fruto de um assalto sistemático a todos os bens |(que eram muitos!) roubados dos africanos pelos europeus.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

David Bowie e Christiane F.

Vai-se mais um dos grandes do rock britânico. Bowie lançou seu mais novo trabalho musical no dia em que completou 69 anos, em 8 de janeiro. Dois dias depois (domingo 10), o camaleão do rock foi vencido pelo câncer, numa luta que travou por um ano e meio contra a doença.
Para mim, que usei diversas vezes o filme "Eu, Christiane F., 13 anos, drogada, prostituída..." em sala de aula para falar sobre drogas, inclusão e aceitação, com posterior debate em forma de juri, ele jamais vai sair da memória.
Bowie faz uma ponta no filme, com um show em Berlim, durante o qual Christiane e seus amigos da rua Kurfürstendamm se drogam. Christiane é fissurada em Bowie. Chama a atenção uma cena do filme, em que ela ganha um LP de Bowie de presente do namorado de sua mãe e, em seguida, o guarda entre seus discos, ao lado de outro LP dele, por acaso o mesmo, que ela já tinha.
Durante o show no filme, o artista multi-performático canta sua emblemática canção "It's too late" (It's not the side-effects of the cocaine. I'm thinking that it must be love. It's too late - to be grateful. It's too late - to be late again. It's too late - to be hateful). Para a adolescente Christiane e sua turma era, de fato, muito tarde (too late). Até hoje Christiane (ainda viva e uma senhora de 60 anos), continua enfrentando o monstro da droga. Seu ídolo morreu antes dela vencido por um outro monstro: o câncer.
Conheça o artista e sua impressionante obra, no artigo anexo.

DEPOIS DE WORMS, A CAÇADA A LUTERO

No último dia da Dieta de Worms, 26 de maio de 1521, já sem a presença de Lutero, foi decretado o Édito de Worms. O documento fora redigido ...