sexta-feira, 16 de abril de 2021

LUTERO EM WORMS – A CHEGADA (16.04.1521)


Hoje em dia, redes sociais lançam algumas pessoas do anonimato à fama num átimo. Influencers da noite para o dia, elas tornam-se nacionalmente conhecidas. Suas postagens são celebradas, viram memes e ocupam os trend topics. Junto com a fama vem o implacável julgamento da opinião pública.

Há 500 anos, não havia redes sociais. Mas já havia prensa. Com a impressão e a divulgação, as 95 Teses de Lutero se espalharam em velocidade de Whattsapp, causando furor. Da porta da igreja de Wittenberg, em 17 de outubro de 1517, para o mundo.

Pouco mais de quatro anos depois, Lutero virara um influencer de renome. Sua ousadia já havia chegado até a Roma, e o papa já reagira com vigor em outubro de 1520, com a bula “Exsurge Domine”, rebatendo 41 supostos erros das 95 teses.

Agora ele tinha que dar satisfações também ao Imperador. Numa quase condução coercitiva, Carlos V intimara Lutero e enviou até carruagem e escolta com salvo-conduto, para levar Lutero a Worms em segurança. A comitiva havia partido de Wittenberg em 2 de abril de 1521 e, ao longo de todo o trajeto de quase 600 Km e uma viagem de duas semanas, as manifestações de apreço e apoio a Lutero eram uma constante. Ele havia pregado com sucesso em Erfurt, Gotha e Eisenach.

No dia 16 de abril de 1521 eles chegaram a Worms. A condição de influenciador de Lutero ficou muito evidente. As pessoas se aglomeravam nas calçadas, corriam aos balcões e afastavam as cortinas das janelas para vê-lo e saudá-lo. Desejavam-lhe sorte e coragem para enfrentar o que o esperava. A população da cidade nem disfarçava. Para desgosto das autoridades, Lutero virara um ídolo. Foi efusivamente recebido por mais de duas mil pessoas! Um sucesso, para quem chegava a Worms por intimação da Dieta convocada pelo Imperador Carlos V. Não, dieta não é regime (risos); é assembleia (mais risos)!

A Assembleia Imperial estava reunida desde janeiro em Worms. O objetivo era tomar decisões para todo o Império. O imperador queria resolver logo a pauta germânica para voltar aos seus afazeres no maior império da Terra, à época – nem alemão ele falava direito. Mas, o pessoal reunido em Worms tumultuou a agenda da Dieta. Lutero, por exemplo, nem estava na lista. Mas todo mundo só falava nele, e os príncipes alemães queriam resolver as pendengas com Roma de uma vez por todas. Estavam de saco cheio do papa mandando nas suas coisas. Assim, Carlos V abriu uma brecha na agenda para resolver o problema Lutero.

Por causa dessa Dieta, mais de dez mil pessoas passaram por Worms. A cidade tinha pouco mais de sete mil habitantes. Entre esses visitantes estavam o imperador Carlos V e sua comitiva, 80 príncipes, 130 condes, diplomatas de reis estrangeiros, muitos nobres e todas as potestades e principados de Roma com suas comitivas de conselheiros, cavaleiros, escravos e serviçais.

Worms vivia em clima de convenção desde janeiro, e a normalidade havia abandonado a cidade. A hospedagem dessa multidão era desafio e oportunidade de negócio e espaço para a criminalidade. O fato de estarem em plena Quaresma não importava e o jejum... bem, que se danasse.

O mais detestado hóspede da cidade era o núncio papal Girolamo Aleandro. Todo mundo sabia o que ele veio fazer na Dieta, e a opinião pública pró-Lutero era implacável. Ciente disso, ele só andava na rua com seguranças. As gráficas haviam se encarregado de espalhar em Worms muitos folhetos sobre o reformador. O próprio Aleandro disse que todo dia parecia chover escritos de Lutero na cidade, em alemão e latim: “até parece que não se vende outra coisa por aqui além de escritos de Lutero”.

Ao chegar, Lutero hospedou-se no Johanniterhof, de 16 a 26 de abril de 1521, e teve que dividir o quarto com outros dois hóspedes. O local foi escolhido com cuidado. Conselheiros do príncipe da Saxônia estavam alojados lá, mas também o marechal Ulrich von Pappenheim, de modo que o desejo de ter Lutero sob controle estava ao menos em parte garantido.

No comando da Dieta estava Carlos V. Mas, quem imagina um circunspecto senhor de barbas grisalhas exercendo um poder majestático, engana-se. O imperador era um jovem de 19 anos! Quase um menino. O homem mais poderoso da Europa era um menino. Poderoso, mas seu poder dependia de muitos conselheiros; entre eles João Eck, assistente do príncipe-arcebispo de Tréveris e porta-voz do imperador no caso de Lutero; e o próprio Aleandro. Mas também de disputas com políticos experientes, como os príncipes alemães.

Ao chegar no dia 16, Lutero foi convocado a comparecer diante da assembleia no dia seguinte, às 16 horas. Seu advogado seria Jeromee Schurff, professor de direito canônico da Universidade de Wittenberg. Apesar da boa acolhida na cidade, é possível imaginar que aquela noite não seria exatamente uma noite de sono tranquilo. 


Continuo essa história amanhã.

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