terça-feira, 16 de julho de 2013

Jesus praticou o relativismo teológico

Um dos pontos mais controversos nos debates em torno da correta interpretação da Bíblia diz respeito ao que muitos chamam de liberalismo ou relativismo teológico.

Segundo os que acusam a teologia de ter ido longe demais, a reflexão de muitos teólogos passa por cima de preceitos bíblicos que deveriam permanecer intocados. Os alvos preferidos desses críticos são os teólogos que utilizam as ferramentas da pesquisa histórico-crítica e aqueles que se abrigam sob o grande chapéu da Teologia da Libertação.

Segundo esses mesmos acusadores, foi graças a esta relativização teológica que hoje as igrejas na Europa estão vazias (o que de modo algum é verdade, uma vez que um evento como o Dia da Igreja na Alemanha reúne tantos cristãos quanto a Marcha Para Jesus no Brasil). Afirmam, ainda, que este processo deve acontecer no futuro também no Brasil, especialmente na IECLB e nas igrejas que seguem o pensamento teológico europeu.

De minha parte, sou profundamente grato pela pesquisa histórico-critica da teologia do século 20, que tem trazido à luz importantes verdades ligadas ao contexto histórico dos personagens bíblicos. Este conhecimento não reduziu a minha fé, nem enfraqueceu convicções. Antes, desmistificou alguns conceitos pueris sobre a fé, amadurecendo-a e aprofundando a reflexão contextualizada da mesma, permitindo avançar. Afinal, a fé não é algo estanque. A própria Bíblia é fruto de uma caminhada de fé de três milênios e a Palavra de Deus é dinâmica e requer constante atualização.

Também sou grato pela moderna teologia europeia, que joga limpo com a complexa realidade da humanidade pós-moderna e não tenta passar anestésico nas dores do presente. Antes, parte da Palavra de Deus para refletir com sobriedade sobre temas como guerra e paz, intolerância, ecumenismo, sexualidade, consumismo, gênero, preservação da Criação e muitos outros.

Por isso mesmo, também julgo a teologia da libertação um importante passo nesse processo constante de atualização da Palavra de Deus. Ela busca concretizar a mensagem de Cristo para dentro da realidade de injustiça e segregação do mundo, anunciando a salvação e a justiça de Deus em Cristo num formato que fala para dentro da realidade das pessoas que sofrem.

Esta curva de reflexão não é nenhuma novidade e o próprio Jesus histórico a fazia todos os dias, ao longo dos seus três anos de ministério. Por isso, não entendo a recusa dessa reflexão, nem a acusação de "relativismo", quando a radicalização da palavra de Deus é um princípio inalienável da reflexão teológica em todos os tempos.

A maior prova dessa curva de reflexão é que Jesus mesmo disse várias vezes: "Eu, porém, vos digo!". Cada vez que o Mestre iniciava uma frase com esta afirmação, ele praticava flagrante relativismo teológico. Ora para contestar, ora para enfatizar mais ainda alguma afirmação do Antigo Testamento, que era a Bíblia que Jesus usava e conhecia.

Isso de modo algum significa que Jesus amenizou a Palavra de Deus. Antes, a tornou atual, acentuando seu significado para os tempos em que viviam ele e seus contemporâneos.

Este é um bom princípio hermenêutico, do qual eu não pretendo abrir mão. E as ferramentas da pesquisa histórico-crítica, bem como a profunda reflexão teológica baseada no confronto da Bíblia com outras ciências, como a sociologia, a psicologia e a pesquisa científica, só contribuem para a crucial atualização do que Deus tem a nos dizer hoje.

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