“O trabalho dá-nos dignidade. Quem trabalha é digno, tem uma
dignidade especial, de pessoa. O homem e a mulher que trabalham são dignos.” A
frase é do Papa Francisco pela passagem do dia do trabalho, ontem. Parece
ufanista, num mundo em crise econômica aguda.
Mas ele não fica nisso. “Muitos são os que querem trabalhar
e não podem, o que é um peso em nossa consciência, porque quando a sociedade é
organizada de tal maneira que nem todos têm a possibilidade de trabalhar e de
serem erguidos pela dignidade do trabalho, tal sociedade não está bem e não é
justa”, emendou.
A dignidade do trabalho é um paradigma universal e unânime, válido
há séculos, mas que precisa ser revisto. Cada vez mais nações têm taxas de
desemprego beirando os 25 por cento; um número frio, mas que fica mais palpável
se eu digo que nesses países um em cada quatro adultos aptos ao trabalho não
consegue trabalho. Num ambiente assim, a dignidade se foi para os desempregados
e também para os empregados.
Explico. Para os desempregados, por óbvio, a procura por
algo que fazer para sustentar a vida e a família é uma tortura diária, que pode
durar semanas, meses e até anos. O paradigma de que só é digno quem trabalha
transforma-se num fardo demasiado pesado para ser suportado por muito tempo.
Muitos vão à loucura, ao desespero, à depressão e até ao suicídio por conta do
sentimento de “indignidade” que lhes causa a rejeição diária da ausência de uma
vaga para trabalhar no que quer que seja. Em diversos países da Zona do Euro
esta é a realidade de um trabalhador em cada grupo de quatro.
E os outros três, que ainda têm emprego, será que há
dignidade em seu trabalho? Não quando perder o emprego é uma ameaça real,
diária, avassaladora. O medo de perder o trabalho também é humilhante. Nessas
condições de emprego, muitos veem-se obrigados a defender seu posto a qualquer
preço, com um sentimento agudo de frustração, de modo irracional e solitário.
Num ambiente de trabalho em que cada posto vale ouro, quem
ainda oferece vagas para trabalhar usa a sua condição para exigir cada vez mais
e não raro faz chantagem com quem ocupa o posto. Há cada vez mais limites para
quem está empregado e cada vez menos limites para quem oferece trabalho, numa
escalada de violência moral inadmissível, torturante.
Num ambiente assim, aumenta cada vez mais o fosso entre o
que é possível e o que é pedido em cada vez menos tempo. Tal sistema de
trabalho torna-se implacável, e respeita cada vez menos a fragilidade da vida.
Segundo a lei da oferta e da procura, o trabalhador tem de ser perfeito e
neutro como as máquinas que o rodeiam. Aí, até o trabalho perde seu paradigma
de dignidade. Nem mais, nem menos.
Parabéns , seu texto apresenta de forma clara a forma como os paradigmas dominantes atuam sobre a população simples, fazendo com que elas acreditem nas falsas verdades como óbvias.
ResponderExcluirSou de Joinville, mas moro em Matinhos utilizarei seu texto em sala de aula. grata
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