terça-feira, 29 de setembro de 2009

Um método para exercitar a utopia



Uma das mais admiráveis características do moderno povo alemão é a sua capacidade de planejamento. Impressiona a ausência quase absoluta do improviso, do jeitinho, da mudança de última hora. Antes da execução de qualquer projeto, ele foi exaustivamente estudado em todos os seus ângulos e nuances, no sentido de reduzir ao mínimo qualquer risco de surpresa ou falha.
Não só os grandes projetos são alvo de planejamento rigoroso. Cada passo do dia-a-dia é concretizado somente após o necessário tempo de preparo. Esse rigor no cuidado com o que se faz e as consequências de cada ato na vida pessoal e coletiva levou os alemães a desenvolver diversas teorias científicas que ajudam a planejar.
Uma dessas teorias, que me fascina, é a Zukunftswerkstatt (Oficina do Futuro), desenvolvida pelo futurólogo alemão Robert Jungk, com participação de Rüdigerr Lutz, Norbert R. Müllert e outros pesquisadores. Já no final dos anos 1980 eu participei de um seminário sobre o tema na Alemanha. Foi uma das melhores reflexões que já fiz.
A Zukunftswerkstatt é um bem-fundamentado método de trabalho para instigar a fantasia, na busca de soluções para os problemas da sociedade a partir de ideias inovadoras. O que mais fascina no método é sua absoluta aposta no trabalho coletivo. Ninguém impõe nada. O grupo trabalha em conjunto, a partir dos aspectos que deseja melhorar, na busca de soluções coletivas, com o acompanhamento de moderadores especializados no método.
O método da Oficina do Futuro tem um amplo espectro de aplicações, que vai desde simples aulas no ambiente escolar, passando pela solução de problemas e a busca de idéias e estratégias inovadoras até sua aplicabilidade em comunicação. Projetos para o futuro, objetivos e resoluções para entidades, organizações, associações de bairro, ONGs e os mais diversos grupamentos são buscados em conjunto, num ambiente democrático e inclusivo. Assim, a Oficina do Futuro também é uma excelente forma de promover participação cidadã na busca coletiva de soluções para os problemas comuns da rua, do bairro, da cidade.
O principal objetivo do método é a busca de soluções e de caminhos que os participantes já procuravam sem sucesso antes de aplicá-lo. Com um assunto à mão, busca-se por perspectivas e elucidações (novas formas de abordagem e de solução), além de trabalhar com o que cada participante sente em relação ao futuro (a personalidade de cada um torna-se central), valorizando a experiência de vida de cada um. Ajuda a desconstruir medos em relação ao futuro e a obter autoconfiança em relação à própria capacidade de resolver os problemas.

Como funciona – O método abrange três fases principais, sem contar aspectos iniciais como a preparação, a escolha do tema e do local.
A primeira fase é a da crítica/reclamação, período em que os participantes expressam sua insatisfação, crítica, experiências negativas em relação ao tema proposto. A fase deve acontecer sem barreiras ou regras que limitem ou cerceiem a participação. A análise dos problemas não faz parte desta fase, que consiste numa listagem para a continuidade dos trabalhos na fase seguinte. O jeito mais prático, é fazer uma tempestade de idéias em pequenos bilhetes que depois são ordenados por temáticas segundo os princípios do brainstorming.
A segunda fase é a da fantasia/utopia, na qual se requer a participação criativa de cada um dos participantes. Exige “asas” para pensar de maneira utópica, com base na afirmação: “como seria bom, se…”. Afirmações assassinas, do tipo “Isso é impossível! Isso é ridículo”, são proibidas. A fantasia deve ser completamente livre de qualquer controle. A seleção das idéias acontece da mesma maneira anterior, por meio dos bilhetes do brainstorming.
A última fase é a da práxis/concretização, que liga as duas fases anteriores. Agora sim, é avaliado o que pode ser concretizado ou não. Nesta fase o método exige o trabalho com dinâmica de grupo e a participação de pessoas qualificadas, profissionais ou especialistas, para ajudar no desenvolvimento da idéia. Nada impede, porém, de continuar trabalhando apenas com o grupo, considerando seus próprios integrantes os especialistas que vão solucionar o problema. A fase necessita, porém, de conhecimento de planejamento estratégico, conhecimento para a execução e o domínio de processos de trabalho grupal.
Cabe ao moderador, além de orientar cuidadosamente cada uma das fases, dizer quando a Oficina do Futuro está concluída (o objetivo foi alcançado ou uma nova oficina deve ser implantada, para continuar a reflexão). Toda a caminhada é repassada e avaliada, com a pergunta final pelo que deve ser feito a seguir. A avaliação da Oficina do Futuro é fundamental, porque permite aprimorar o processo, aprendendo com os erros e os acertos.

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