Há quase 500 anos, um corajoso monge alemão escancarava a falibilidade da Igreja. A arrogância papal de então não aceitou a pecha e, em vez de ouvir um líder de um grupo que só queria uma Igreja mais condizente com sua pregação, preferiu persegui-lo e excomungá-lo, tudo para manter o status quo.
Não posso deixar de lembrar de Lutero nesta história toda do envolvimento da Igreja Católica com os escândalos sexuais de seus sacerdotes. Não, não me entendam mal. Não estou dizendo que os luteranos são melhores que os católicos, nem que Lutero fez o certo ao liderar um movimento que resultou numa separação de Roma.
Ao contrário, como luterano, defensor apaixonado do movimento ecumênico, eu admiro e respeito a Igreja Católica porque há muita gente boa nela, muitos que vestem a camisa de Cristo com uma paixão impressionante. Ou Lutero não era um bom católico? Defendo também que a nossa divisão é o maior dos escândalos. Coloca sob grave suspeita tudo o que pregamos. Uma Igreja forte para mudar o mundo tem que ser unida. Com todas essas divisões, o nosso testemunho é pífio, hipócrita e soa falso.
Os escândalos sexuais são só mais um grave sinal de mundanidade da igreja, não só da igreja católica. Há tarados, pedófilos, maníacos em todas as confissões. Gente que bate no peito para falar de Cristo e, entre quatro paredes, não tem escrúpulos em divertir-se com brinquedos sexuais ou filmes pornô, até aproveitando congressos cristãos longe de casa para fazer uma visita a endereços que prestam esse tipo de serviço.
O mais lamentável, entretanto, é o recorrente costume de esconder, disfarçar, tapar o sol com a peneira, fazer de conta que isso não existe, ignorar solenemente e, até, partir para o ataque quando não há mais argumentos de defesa. Volta e meia se comenta algo não tão decente dentro da igreja ou que derrapa no perigoso pântano que tanto gostamos de apontar no mundo, logo seguido da recomendação: "Mas não comente isso com ninguém!".
O pior de tudo é quando se usa a máscara da falsa moral, daquela que aponta o erro do outro com o próprio dedo lambusado.
Aliás, somos mestres nisso. Estamos adorando esse maldito julgamento dos Nardoni, porque ele é um espetáculo jurídico-circense que busca o mal extra nos. Com isso, nos tornamos bem melhores do que os outros. Nos sentimos pessoas justas, honestas, incapazes de um ato assim. Imagina! Somos até melhores do que os líderes dessa igreja, que está cheia de pedófilos, não é verdade?
Então, ironias à parte, somos todos miseravelmente mentirosos, desonestos, dissimulados, bons em acusar o outro e péssimos em reconhecer e confessar as próprias derrapadas. Passamos uma vida inteira construindo a própria reputação jogando lama nos outros. Mas a verdade, mesmo, aquela que não pode ser ocultada por ninguém, é somente uma: "Eu não passo de um miserável e fedorento saco de vermes!" Lembram de quem é esta frase? Pois é! Dele mesmo: Martim Lutero.
Junto com ele, eu só posso dizer: que Deus tenha misericórdia de nós e nos acolha em sua benevolente graça. Porque não nos resta, definitivamente, outra esperança. Aos pés do Cristo Ressurreto, nossa maldita dissimulação se torna tão transparente quanto o cristal, tão visível quanto uma montanha e tão vergonhosamente exposta quanto a nudez.
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