quarta-feira, 31 de outubro de 2012

O diamante nova-iorquino e Sandy no Haiti



O primeiro-ministro haitiano, Laurent Lamothe, entrega comida a moradores de Porto Príncipe afetados pelo furacão Sandy

O mundo só tem olhos para os diamantes. O sentido figurado desta afirmação torna-se quase sádico, quando se lê as notícias publicadas nos jornais e divulgadas pela mídia eletrônica nas últimas 48 horas sobre o furação Sandy. Todos os olhos do mundo estavam voltados para o “diamante”.

Só se fala do quanto a tempestade afetou Nova York. A bolsa de Wall Street ficou inoperante, os transportes públicos pararam e todos os serviços estavam paralisados pelo furor do tempo. E, pasmem, um jornal televisivo até entrevistou uma turista brasileira desolada porque estava em Nova York e não podia fazer as suas compras porque todas as lojas estavam fechadas.

 Ao mesmo tempo, mostrava um jornalista ousado, sobre o que sobrou da varanda de uma casa, em meio à água revolta e enfrentando o vento que uivava ao seu redor, fazendo a sua reportagem sensacionalista. Pior, em flagrante desrespeito, tipicamente brasileiro, à ordem da defesa civil de manter-se longe das ruas!

Meu Deus! O diamante estava em perigo!  Sandy tem o impressionante tamanho de mil e cem quilômetros de extensão, e todos só viram o diamante sendo castigado. Todos os olhos estavam voltados para Nova York, para Obama e para as dramáticas consequências da tempestade sobre as eleições americanas.

Até o belíssimo veleiro que participou de todas as filmagens da série Piratas do Caribe foi afundado pelo Sandy, levando o seu capitão para sempre. Uma notícia tocante, sem a qual o mundo não poderia seguir.

Com esses temas na pauta dos jornais, telejornais e sites do mundo inteiro, ninguém deu muita atenção para os estragos que Sandy provocou além dos arranhões no precioso diamante.

O furacão Sandy, com seus impressionantes mil e cem quilômetros de extensão, categorizado como uma "supertempestade" ao atingir os Estados Unidos (e o precioso diamante nova-iorquino) nesta segunda-feira (29/10), deixou rastros de destruição por onde passou.

Um dos países mais afetados pela força destruidora de Sandy foi o Haiti. Pelo menos 51 pessoas morreram. O governo e a ONU agora temem um surto de cólera e de falta de alimentos devido aos estragos. Novamente o Haiti. Aquele mesmo que todos esqueceram, embora 90 por cento da população continue vivendo entre os escombros do terremoto de 2010 e acampando em barracas precárias, ao lado de esgoto e de falta de tudo, absolutamente de tudo.

“A maioria das plantações que foi danificada pelo furacão Isaac em agosto foi agora destruída pelo Sandy”, afirmou à agência Reuters o primeiro-ministro haitiano, Laurent Lamothe. “Logo, a segurança alimentar será um desafio”, completou. Lamothe, sobrevoou no sábado as regiões afetadas para observar os estragos provocados por Sandy, mas “será preciso esperar os próximos dias para se obter dados mais específicos”, destacou a Defesa Civil.

Menos de três anos após um terremoto que forçou 370 mil pessoas a migrar para a capital, Porto Príncipe, e a viver em acampamentos e casas precárias, Sandy deixou mais 18 mil haitianos sem abrigo. A região mais afetada pelo furacão foi o departamento do Oeste, que inclui Porto Príncipe, onde 20 pessoas morreram, com famílias inteiras sendo soterradas por deslizamentos. No sul do Haiti, Sandy deixou 18 mortos e inundou amplas áreas de plantios, além de destruir estradas e pontes.

É assustador... Provavelmente, Nova York hoje está com as ruas limpas e o comércio funcionando. Enquanto o Haiti, pobre Haiti, ninguém viu, nem ouviu, tampouco se importou.

Enquanto todos estão polindo o diamante e um planeta inteiro de curiosos se junta em volta dele, uma montanha de gente logo ali, ao lado, adoraria ter como abrigo o que sobrou dos edifícios afetados por Sandy em NY. Talvez, até se contentaria em receber como doação os alimentos “destruídos” pelas águas da tempestade nos entupidos supermercados das cidades americanas por onde Sandy passou, exibindo a sua fúria.

No Haiti, Sandy destruiu até a rocinha que, teimosamente, as famílias estavam plantando para recomeçar uma vida difícil, muito difícil...

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