quarta-feira, 6 de junho de 2012

As pantufas verde-oliva do general



O contundente texto do jornalista Luiz Claudio Cunha no Viomundo de ontem, sobre o cinismo verborrágico e explícito de um senhor de 91 anos chamado Leônidas Pires Gonçalves, foi como tirar a casca de uma ferida antiga. Cada palavra, cada linha da triste memória de um passado dolorido e traumático faz brotar um nó no peito da gente. Você pode ler o texto de Cunha na íntegra aqui.

Eu havia visto parte da insubordinação explícita do velho comandante de torturadores na entrevista que deu ao Globo News. Vi o repórter corar de estupefação várias vezes. Vi o insensível ancião expor toda a sua torta ideologia como quem dá uma aula de bons costumes. Não resisti a tanta arrogância e autoenaltecimento de um crime condenado por qualquer tribunal humanitário do mundo civilizado. Leônidas não se rende. E não tem medo. Ele está acima da nação. Ele voltou à carga em entrevista ao O Estado de S. Paulo.

Ele não respeita nem a Comandante em Chefe das Forças Armadas que integrou. Para ele, aquela mulherzinha não passa de uma impostora. Ele deveria ser enquadrado pelo crime de desacato a autoridade, essa mesma lei com que ameaçam os cidadãos comuns com imensos cartazes nas repartições públicas, para intimidar qualquer reclamação pelo tratamento desumano que costumam dar à gente humilde desta varonil nação. Mas ele deveria ser enquadrado na lei militar de motim, porque, mesmo de pijama e pantufas, lhe cabe bater continência à Comandante em Chefe das Forças Armadas.

Eu vi Leônidas dizer que não houve exílio... que os exilados eram uns covardes fugitivos, que saíram do país porque quiseram. "Que ficassem e enfrentassem as consequências de sua rebeldia!" Que fossem machos e se dispusessem a integrar a lista dos desaparecidos e mortos nos porões obscuros de que Leônidas cinicamente desmentiu a existência. Não suportei. Mudei de canal para não ver tamanha exibição de nonsense. Também não li a entrevista no Estadão.

Talvez não tenhamos que ser submetidos aos desvarios de um velho caudilho demente. Mas fez bem a Globo News e o Estadão em escancarar o tamanho do cinismo verde num país que tenta construir uma democracia sólida, tijolo por tijolo. É bom sabermos o quanto a Comissão da Verdade é fundamental para pavimentar de boas pedras o caminho que leva à democracia. Temos que lidar com os nossos fantasmas. E Leônidas Pires Gonçalves é um fantasma insepulto. Nonagenário, o velho aprendiz de nazista tripudia da nação e faz piada sórdida da dor de famílias inteiras que só querem saber em que vil buraco deram sumiço no seu filho ou filha que ousou desafiar o status quo. Enquanto Leônidas mostra os seus dentes cariados, nós temos cada vez mais certeza que não dá para colocar uma pedra sobre tudo isso.

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