terça-feira, 15 de maio de 2012
O desperdício é uma ignomínia
Faço questão de reproduzir aqui o texto de Moacir Pereira de sua coluna do Jornal de Santa Catarina de hoje. Com dados contundentes, ele expõe a ignomínia do desperdício de alimentos praticada entre nós. O Brasil está na lista dos dez mais neste quesito, chegando a desperdiçar um terço de tudo quanto produz, ou nada menos do que 10 milhões de toneladas! Sempre que vou a um restaurante self-service, observo como as pessoas exageram e, depois, deixam tanto no prato que daria para alimentar mais uma pessoa. É abominável! Irrita-me profundamente, e eu tenho que me conter para não ir em direção à pessoa para chamar a sua atenção publicamente. Tenho amigos que sabem o que é ter que comer cascas de batatas para matar a fome, nos tempos de criança durante a guerra na Alemanha. Essas pessoas ficam doentes quando veem comida sendo desperdiçada. E eu me solidarizo com elas. Em sua homenagem, segue o texto de Moacir Pereira, que deveria ser exposto em todos os restaurantes, empresas alimentícias, portos e de transportes, além de ser afixado na porta da nossa geladeira:
A fome no mundo
Quem visitar as instalações da Ceasa, em São José, com certeza ficará consternado com a quantidade de hortaliças e frutas que apodrecem no lixo. Um cenário que se repete em todas as centrais de abastecimento do país, como na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), o maior mercado da América Latina, onde o volume das perdas atinge 1% de tudo o que é comercializado em um dia: mais de 100 toneladas de comida no lixo.
É por estas e outras que, segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), o Brasil figura entre os 10 países que mais desperdiçam comida no mundo. Ao longo da cadeia do desperdício, entre a lavoura e a mesa do consumidor, algo em torno de 35% da nossa produção agrícola vai para o lixo. São 10 milhões de toneladas, que poderiam alimentar todos os milhões de brasileiros que ainda sobrevivem abaixo da linha da pobreza. Os números chegam a ser ofensivos.
Tem mais. De acordo com o Instituto Akatu, uma organização não governamental (ONG) que se dedica a promover o consumo consciente, cada família brasileira, em média, desperdiça 20% dos alimentos que compra durante a semana. Na soma, o suficiente para alimentar outras 500 mil famílias. Vergonhoso, quase criminoso no contexto de um mundo que tem muita fome e pouca comida, como os números e as projeções da FAO o comprovam.
Cálculos feitos pelo Serviço Social do Comércio (Sesc), em 2010 – e de lá para cá nada há de ter mudado neste panorama –, dão conta de que R$ 12 bilhões são jogados fora diariamente. Dinheiro suficiente para dar café da manhã, almoço e jantar a quase 40 milhões de pessoas.
Pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) investigou as causas das perdas ainda na lavoura, constatando que elas começam já na fase da colheita e armazenamento local, por falta de qualificação e treinamento do pessoal empregado. “Nesta fase, os estragos podem ocorrer tanto do ponto de vista físico quanto de qualidade do produto.” Na pós-colheita, o estudo aponta para a infraestrutura deficiente na rede de armazenagem e no transporte (quase 70% das cargas ainda são deslocadas por transporte rodoviário).
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em outra pesquisa, fez a “divisão das culpas” e concluiu que do total do desperdício, 10% ocorrem durante a colheita, 50% no manuseio e transporte, 30% nas centrais de abastecimento e 10% são de responsabilidade dos supermercados e consumidores. Sim, os próprios consumidores que arcam com o prejuízo causado pela “inflação do desperdício” ajudam a causá-la.
Conhecidas as causas, fica a pergunta: quando serão aplicados remédios capazes de reduzir as perdas a um nível civilizado (perda zero não existe neste caso) e retirar o Brasil da lista dos países que mais desperdiçam comida num mundo faminto?
(Artigo de Moacir Pereira publicado no Jornal de Santa Catarina do dia 15/05/2012)
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