quarta-feira, 27 de julho de 2011

Como quebrar o ciclo do ódio 4

Geert Wilders, político holandês de extrema-direita


Como era de esperar, a admiração pela coragem de Anders na execução minuciosa de seu objetivo fica na esfera dos segredos íntimos. Toda a direita, em uníssono, se desvencilhou de qualquer ligação, apoio, ou mesmo proximidade ideológica com Breivik. Ele está só. Ninguém lhe empresta o guarda-chuva. Antes, se antecipam e acusam a “esquerda” de aproveitar-se do atentado para empurrar a culpa no sapato da extrema-direita. É o argumento mais disseminado entre os defensores de leis mais rigorosas para os estrangeiros na Europa; de uma direita que se diz moderna, que afirma não ter nada a ver com o nazismo ou com o fascismo.

Mas Breivik, certamente, aditivou a sua alma em afirmações como a de que “a violência islâmica não é conseqüência de abuso da religião, mas se inspira diretamente no Alcorão”; ou que “o islamismo não é uma religião, mas uma 'ideologia de violência', que quer exterminar qualquer outra forma de sociedade”; ou ainda esta, que “não há outra religião em que seja tão fácil passar para a violência e o terrorismo”. Por trás de todas estas falas há somente um ponto de vista: o islã é o próprio mal, por si só. Elas vieram da boca do político de direita holandês Geert Wilders, do blog anti-islâmico “Politically Incorrect” e do político e autor de direita campeão de vendas Thilo Sarrazin.

Breivik foi respirando esta ideologia durante toda a sua juventude e as regurgitou em seu extenso manifesto de 1.500 páginas, no qual nem o Brasil escapa: “A miscigenação racial fez muito mal ao Brasil, contribuindo para seu subdesenvolvimento”. Esses pensamentos foram moldando a alma, o caráter de Breivik e, até explodirem no exercício tresloucado de ódio do dia 22 de julho, eram somente palavras. Naquela fatídica sexta-feira, a pregação de ódio transformou-se numa bomba de 500 quilos e dezenas de adolescentes mortos inocentemente por inúmeras balas. Ações com as quais a direita, como agora se apressa em dizer, não quer ter nenhuma relação.

O blog “Politically Incorrect”, cujos textos são escritos no conforto do anonimato dos autores, prega essa ideologia abertamente desde 2004, esbravejando contra as esquerdas e usando toda sorte de impropérios contra o islamismo, tem dezenas de posts pedindo “punição exemplar” para Breivik, cujo ato é qualificado de “obra diabólica”, ou “um desserviço para a causa”. Ao mesmo tempo, acusa a imprensa européia de ter atingido o seu nível mais baixo, nas reportagens sobre os atentados, por escreverem “relatos unilaterais e não raro se aproximarem da transfiguração, difamação e desqualificação” sobre os reais motivos de Breivik, que eles classificam como um “crime terrível, repugnante e digno da mais severa condenação”. Sem puxar novo fôlego, logo emendam que as reportagens estão minadas de uma “desavergonhada, cínica e profundamente desrespeitosa fracção dentro da esquerda internacional, que sequer foi capaz de dar um tempo para luto sincero e consternação”.

As reações da direita ao atentado na internet apressaram-se em qualificá-lo como algo “não em ordem”. Segundo sua interpretação, não foi certo escolher jovens como alvos do ato terrorista. É uma formulação pérfida, que poderia levar à interpretação de que os atentados estariam OK se não tivessem vitimado justamente gente jovem e inocente. Qualquer outro alvo seria admissível.

Para o político holandês Geert Wilders, um dos mais influentes líderes de extrema-direita no continente atualmente – e que tem boas chances de tornar-se primeiro-ministro da Holanda um dia desses –, qualificou os atentados de Anders como o ato de um insano. “Enche-me de repulsa o fato de o ofensor referir-se ao meu nome e ao do meu partido no seu manifesto”, desconversa Wilders no site do seu partido. Segundo ele, nem ele nem o seu partido podem ser responsabilizados pelos atos de “um idiota solitário, que abusa dos ideais livres de anti-islamização de maneira violenta”.

Também a Frente Nacional francesa, partido fundado por Jean-Marie Le Pen e liderado por sua filha Marine Le Pen, refutou ultrajado qualquer vínculo com a tragédia norueguesa. Segundo Marine, Anders deve ser “impiedosamente punido”.

Outros defensores da anti-islamização, como o jornalista alemão Henryk Broder, do jornal “Welt”, que escreveu um artigo com o título “temer o islã é uma virtude”, tentam se esquivar de qualquer influência sobre Anders. Infelizmente, trechos de uma de suas entrevistas a um jornal holandês foram parar no manifesto do norueguês. Em um ensaio com o título “O Manifesto e Eu”, ele descreve Breivik como “um monstro em forma de gente, que não é burro”. Argumentos perfeitos, segundo ele, mas que o conduziram a um objetivo absolutamente trágico. Broder prefere entrincheirar-se no cantinho irônico do “o que aconteceria se”, para afirmar que, “caso o norueguês loiro e de olhos azuis não tivesse lido Broder e Sarrazin, mas Patrick Bahners e Roger Willemsen, ele não teria se transformado num assassino em massa”.

Em toda a Europa, a direita está fazendo um esforço gigantesco para distanciar-se de Anders Breivik. Ele ficou isolado no cenário. Todos os discursos – ao menos os oficiais – vão nessa direção. Há muita estratégia política em jogo para admitir influência sobre um maluco como Anders. No mínimo, ele não entendeu os insuspeitos objetivos do discurso xenófobo de grande parte da direita no mundo.

Infelizmente para essa direita, muitos outros podem não estar entendendo bem os seus "nobres" objetivos e, lamentavelmente, farão mais burradas do calibre de Anders.

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